RETALHOS DA MEMÓRIA: A nossa vida vista pela mente humana e sua atividade cerebral.

Escrito por Ana Cristina.

O espetáculo de corpo “Retalhos da Memória”, resultado do processo de pesquisa dos alunos do Núcleo de Artes Cênicas (NAC) do SESI Sorocaba-SP e interpretado por eles em 2006, com direção e concepção de Junior Mosko, retrata as fases da vida humana através de neurônios, mostrando uma trajetória marcada por lembranças.

Como desfecho de uma busca pelo “eu” de cada ator, a peça apresenta, com sutileza em cada personagem, a ação das células neurais por meio de movimentos, individuais ou simultâneos entre o grupo. A união entre o trabalho de corpo, interpretação, iluminação e sonoplastia permitem que o espectador​ ​ mergulhe nas trocas de mensagens entre os neurônios e se identifique durante a manifestação dos sentimentos com agitação, desafios ou calmaria dentro da mente.




A grande reflexão está no fato de que: durante as experiências, os seres humanos acumulam lembranças que os compõem; porém, em determinado momento, como diz um personagem: “o pó unido ao pó”, o coração tecido de memórias será separado da pele de sua sepultura e sua alma ficará ao lado de quem está unido a ele. Ao final, há um poema escrito pelo diretor Junior Mosko que conecta ainda mais as sensações transmitidas pela peça ao crescimento humano e seu ciclo: nascimento, infância, adolescência, idade adulta, velhice e morte.

O espetáculo está disponível na plataforma YouTube e pode ser acessado por meio do seguinte link:​

Em uma progressão de criação de memórias, o espetáculo retrata as fases associando-as aos seus costumes: assim que a atividade cerebral começa, tem-se agitação, uma nítida animação pura e genuína da infância. Uma criança que, como foi dito no poema de Junior, “brinca, chora e pula”; cheia de energia, essa fase apresenta um panorama do que virá e lá se armazenem essas lembranças. Com o passar do tempo, ela cresce, começa a ter responsabilidades e entre a adolêscencia e a vida adulta a criança tende a se perder. A pessoa tenta balancear os sentimentos, entendê-los, mas já não há tanta esperança; enfrenta dificuldades, medos e obstáculos, passa a correr contra o tempo e vivenciar menos o presente. Então, aos poucos, a vida já não é tão longa, os neurônios agem mais devagar e tentam lutar contra aquela força que quer apagar a memória construída; mas, como fica de mensagem: ao pó retornamos e aquelas pulsações que tinham início, veem seu fim.

A composição humana vai além de carne e osso, são sentimentos e retalhos da memória que moldam e dão sentido às ações, fazendo com que o ser tenha a sua história e os seus objetivos. A mente trabalha com essas lembranças e a emoção para que possamos ter uma essência, a alma vai muito além do que vemos, então é apresentada uma visão interior do corpo; porém é inevitável a fala que ressoa em coro na peça “deitai-nos lado a lado para todo sempre”.

Segue poema na íntegra:

Quando fechamos os olhos podemos
sentir a pulsação do nosso coração.
mas nem sempre conseguimos entender
por onde circula a nossa alma.

No desfecho de nossa memória
entramos em crises, choramos, sorrimos,
ficamos tristes, amamos. Todos esses
sentimentos vem recheados de imagens
muitas vezes coloridas, muitas vezes cinzentas.

Quando nascemos nos chegam
sensações de uma vida inteira pela
frente, vida essa que vai alimentando
nossa memória. De repente aquela
criança que brinca, chora e pula, se vê
cheia de responsabilidades, começam a
surgir dificuldades e nossa emoção luta
para tentar organizar nossos
pensamentos de uma maneira equilibrada.

E o tempo que parecia imenso se torna
curto, quando percebemos que nossa
vida é marcada apenas por lembranças
que estão na memória daquela criança
que já não existe mais,  daquele adulto
que se olha no espelho e pergunta:
– Por que você passou tão rápido?

E a memória já não responde com tanta
facilidade começando a falhar, deixando
nossos movimentos mais lentos, nosso
olhar mais distante e nosso pensamento
mais confuso.

Mas tentamos resistir, usamos de todas
as forças para que nossa memória
continue eterna, mas é uma falsa ilusão
porque quando menos esperamos toda
cor se perde dentro da escuridão e toda
vida apenas e simplesmente
resulta no fim. -Junior Mosko

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